Privatizar a TAP<br>é uma opção criminosa!

Manuel Gouveia

Privatizar a TAP é uma ideia tão má, e tão perigosa, que nem o Governo a defende. O Governo apresenta-a como inevitável, assim como quem toma uma decisão mas já está a garantir o alibi para escapar à responsabilidade pelas mais que previsíveis consequências.

Essa inevitabilidade assenta em dois pressupostos, ambos falsos, como o PCP já demonstrou diversas vezes: o pressuposto de que a TAP precisa urgentemente de ser capitalizada e o pressuposto de que o Estado não o pode fazer e só uma privatização o pode permitir.

A TAP, enquanto empresa pública, não se destina a «dar lucro», objectivo das empresas privadas para poderem distribuir dividendos aos seus accionistas remunerando o capital aí investido. A TAP destina-se a criar riqueza para o País. E cria: mais de 12 mil postos de trabalho directos no Grupo; perto de 20 mil indirectos; mais de 100 milhões de contribuições anuais para a Segurança Social e outro tanto para o IRS; mais de doil mil milhões de euros de vendas ao estrangeiro sendo o maior exportador nacional; responsável directa por entre três e cinco por cento do PIB (1). Cria riqueza ainda no sentido de se afirmar como instrumento de soberania, por mal potenciada que esteja a ser e está. E faz tudo isto sem receber qualquer apoio público desde 1997, e com uma dívida que no essencial é relativa aos seus activos (o leasing dos aviões) e a uma negociata nunca devidamente explicada (a da compra da deficitária ex-Vem do Brasil, actual Manutenção Brasil).

Como o PCP já demonstrou, a TAP precisa de ser apoiada pelo Estado Português e não tanto de ser capitalizada: precisa que o Governo e a Administração deixem de ter como único objectivo «criar condições para privatizar»; precisa, como as restantes empresas públicas, de ser libertada das restrições à gestão artificialmente criadas pelos governos; precisa de ser apoiada diplomaticamente, nomeadamente para a resolução do problema no Brasil; precisa de investimento para a modernização da sua Manutenção; precisa que se pare com a desestabilização do handling; precisa que o Estado deixe de favorecer e financiar as suas concorrentes; precisa que a Banca pública assuma o seu papel no financiamento da actividade económica.

As necessidades de capitalização são altamente empoladas porque conduzem directamente à armadilha da inevitabilidade: e à tese de que a União Europeia não permite essa capitalização pelo Estado. O que também é falso. O ministro da Economia, sempre teatral, até levou para a Assembleia da República a «prova»: o documento «Competition Policy Briefing: State Aid for Airline Restruturing». Mas não o deve ter lido, ou teria reparado, logo na introdução, nesta pérola: «Estas regras aplicam-se a todos os sectores da economia, excepto ao sector financeiro, onde existem regras especificas devido à crise [Claro!]. No sector da aviação, muitas companhias enfrentaram dificuldades nos anos mais recentes e receberam apoio público.[Ah!]» Sem falar que um papelucho, mesmo em inglês, não se sobrepõe à Lei Fundamental do País, que estabelece claramente a existência de um Sector Público.

É verdade que existe um conjunto de legislação europeia que se destina a promover a concentração monopolista e a intensificação da exploração da força de trabalho no sector, e procura retirar instrumentos de soberania aos estados. Legislação que foi aprovada por PS, PSD e CDS e denunciada a seu tempo pelo PCP. Mas o Estado português pode e deve enfrentar essas restrições, o problema é que não o quer fazer.

Para terminar estas breves notas sobre mais uma tese da inevitabilidade, recordo os dois últimos processos de privatização. Que em 1998 foi Jorge Coelho quem disse que a TAP ou era privatizada ou desaparecia, e quem desapareceu foi a Swissair que ia comprar a TAP, e a Sabena, que a Swissair havia comprado. Que em 2012, já com o actual Governo, a TAP ou era privatizada ou desaparecia, e dois anos depois até cresceu e muito, e a Ibéria, vendida por essa altura, está a desaparecer.

Felizmente permanece por demonstrar – na TAP – a tese do PCP de que esta será destruída na sequência de qualquer processo de privatização. Estamos confiantes que a luta dos trabalhadores e do povo português continuará a travar esse desfecho impedindo, uma vez mais, esse projecto criminoso do Governo.

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(1) A propósito da anunciada greve de quatro dias na TAP, o presidente da AHP disse que esta provocaria uma redução de 144 milhões de euros de receita turística ao Estado Português e que a hotelaria nacional perderia 384 mil dormidas. Como sempre, aos olhos do patronato, é só quando fazem greve que as empresas públicas e os seus trabalhadores são importantes. Mas estes empolados números ilustram a importância da TAP para a economia nacional.

 



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